Se impessoal vs. se passivo, como sempre
[Pergunta] «Não se desabotoa as calças em público», ou «não se desabotoam as calças em público»?
Obrigada!Carolina Ferreira :: Jurista :: Lisboa, Portugal
[Resposta]
 A partir de frases como «Vende-se casas»  e «Vendem-se casas», João 
Andrade Peres e Telmo Móia dizem na página  237 da 2.ª edição de Áreas Críticas da Língua Portuguesa:
 «Na nossa  opinião, ambas as construções são aceitáveis, embora se 
possa preferir  uma ou outra por razões estilísticas. A nossa posição 
resulta de dois  factores: por um lado a aceitação generalizada por 
parte dos falantes  que o uso do clítico impessoal com verbos 
transitivos parece ter; por  outro lado, o facto de não julgarmos haver 
razões — estruturais ou  semânticas — para aceitar a construção com o 
clítico impessoal nuns  casos e rejeitá-la noutros.» 
Esta é a 
posição prevalecente hoje para construções deste tipo: considera-se que 
as duas construções estão correctas, sendo o valor do clítico se diferente em cada uma delas. Na frase «Não se desabotoa as calças em público», o clítico se tem valor impessoal; na frase «Não se desabotoam as calças em público», o se tem valor apassivante. O se impessoal
 indica indeterminação do sujeito, e o verbo que o acompanha é sempre 
singular, não tendo de concordar com nenhum outro elemento da frase; ao 
passo que o verbo que acompanha o se apassivante concorda em número com o seu agumento interno (neste caso, as calças).
Importa dizer, no entanto, que gramáticos mais puristas consideravam que o clítico se  impessoal não podia ser  usado com verbos transitivos. Segundo Napoleão Mendes de Almeida, na sua Gramática Metódica  da Língua Portuguesa,
 em  construções deste tipo, com verbo transitivo, o verbo deve 
concordar com o  constituinte que está na posição de complemento (à 
direita do verbo), uma vez  que nestes casos o clítico se expressa passividade. Segundo esta perspectiva, a frase em questão deveria ser «não se desabotoam as calças em público».
Resta
 acrescentar que se usa o verbo sempre no singular, se não se tratar de 
um verbo transitivo directo. Diz Mendes de Almeida  que se emprega «a voz  passiva com  os verbos intransitivos  e transitivos indirectos para  indicar impessoalidade,  isto é, para indeterminar o sujeito do verbo, ficando o verbo  sempre no singular» (p. 217). Dá como exemplos «No Rio de Janeiro  passeia-se muito» ou «Precisa-se de costureiras».
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