Saturday, 4 January 2014

"(...) ela abandonara-se-lhe absolutamente" - Eça de Queirós



“(...) ela abandonara-se-lhe absolutamente, toda inteira, corpo, alma, vontade e sentimento: não havia na sua pele  um cabelinho, não corria no seu cérebro uma ideia a mais pequenina, que não pertencesse ao senhor pároco. Aquela possessão de todo o seu ser não a invadira gradualmente; fora completa, no momento que os seus fortes braços se tinham fechado sobre ela. Parecia que os beijos dele lhe tinham sorvido, esgotado a alma: agora era como uma dependência inerte da sua pessoa. E não lho ocultava; gozava em se humilhar, oferecer-se sempre, sentir-se toda dele, toda escrava; queria que ele pensasse por ela e vivesse por ela; descarregara-se nele, com satisfação, daquele fardo da responsabilidade que sempre lhe pesara na vida; os seus juízos agora vinham-lhe formados do cérebro do pároco, tão naturalmente como se saísse do coração dele o sangue que lhe corria nas veias.”

O Crime do Padre Amaro, Eça de Queirós, p. 350

No comments:

Post a Comment