Thursday, 30 December 2010

AL

Cotidiano ( Letra: Chico Buarque)
Versão: Seu Jorge

Todo dia ela faz tudo sempre igual,
Me sacode as seis horas da manhã.
Me sorri um sorriso pontual,
E me beija com a boca de hortelã.

Todo dia ela diz que é pra eu me cuidar,
Essas coisas que diz toda mulher.
Diz que está me esperando pro jantar,
E me beija com a boca de café.

Todo dia eu só em penso em poder parar.
Meio-dia eu só penso em dizer não.
Depois penso na vida pra levar,
E me calo com a boca de feijão.

Seis da tarde como era de se esperar,
Ela pega e me espera no portão.
Diz que está muito louca pra beijar,
E me beija com a boca de paixão.

Toda noite ela diz pra eu não me afastar.
Meia-noite ela jura eterno amor,
E me aperta pra eu quase sufocar,
E me morde com a boca de pavor.

ἡ δὲ τῶν Ἀρεοπαγιτῶν βουλὴ

ἡ τῆς πολιτείας φυλακή

Τὰ εἰς ἑαυτόν



Toda experiência passa a ser uma acontecência, não há mais fatos, mas sim padecimentos. É o resgate da palavra grega pathos, que é ela mesma percepção, experiência, e, igualmente, padecimento, vivência. A experiência, aquilo que é apreendido, é uma abertura ao mundo, um mundanizar, um projetar-se. Os pathe são, portanto, vivências e nada mais. Não são algo que esteja fora, nem que esteja dentro, pois a experiência já não se dissocia do ato de experienciar, o mundo é fruto de um mundanizar. Assim, já não há mais fatos, mas apenas o produto de uma atividade eminentemente existencial, onde a verdade fundamental ou originária é a própria não verdade, a aceitação da finitude do ser humano. Bsb, 12 de julho de 2010-07-12. 23h54. Adições em 13 de julho de 2010. 22h08, Bsb.

Schopenhauer - Die Welt als Wille und Vorstellung II

Schopenhauer afirma que a vida é “(...) ein Geschäft, das die Kosten nicht deckt.”[1]


[1] SCHOPENHAUER, Arthur. Die Welt als Wille und Vorstellung II – Capítulo 46 - Von der Nichtigkeit und dem Leiden des Lebens. Zürich: Diogenes, 2007. 671p.


“Demzufolge gleicht nun zunächst unser Leben einer Zahlung, die man in lauter kupferpfennigen zugezählt erhält und dann doch quittieren muß: es sind die Tage; die Quittung ist der Tod. Denn zuletzt verkündigt die Zeit den Urtheilsspruch der Natur über den Werth aller in ihr erscheinenden Wesen, indem sie sie vernichtet”[1]


[1] SCHOPENHAUER, Arthur. Die Welt als Wille und Vorstellung II – Kapitel 46 - Von der Nichtigkeit und dem Leiden des Lebens. Zürich: Diogenes, 2007. 672p.

“Weil nun aber unser Zustand vielmehr etwas ist, das besser nicht wäre; so trägt Alles, was uns umgiebt, die Spur hievon – gleich wie in der Hölle Alles nach Schwefel riecht, - indem Jegliches stets unvollkommen und trüglich, jedes Angenehme mit Unangenehmem versetzt, jeder Genuß immer nur ein halber ist, jedes Vergnügen seine eigene Störung, jede Erleichterung neue Beschwerde herbeiführt, jedes Hülfsmittel unserer täglichen und stündlichen Noth und alle Augenblicke im Stich läßt und seinen Dienst versagt”[1]


[1] SCHOPENHAUER, Arthur. Die Welt als Wille und Vorstellung II – Kapitel 46- Von der Nichtigkeit und dem Leiden des Lebens. Zürich: Diogenes, 2007. 676p.

A temporalidade faz parte da condição humana, ela pauta o nosso morrer cotidiano:
“Nun ist der Tod as zeitliche Ende der zeitlichen Erscheinung: aber sobald wir die Zeit wegnehmen, giebt es gar kein Ende mehr und hat dies Wort alle Bedeutung verloren.”[1]


[1] SCHOPENHAUER, Arthur. Die Welt als Wille und Vorstellung II – Capítulo 41 – Ueber den Tod und sein Verhältniß zur Unzerstörbarkeit unsers Wesens. Zürich: Diogenes, 2007. 567p.




CQC


[Não zangai comigo, ó senhores expectadores,
Se enquanto mendigo estou prestes a falar aos atenienses sobre a pólis, fazendo comédia.
Até mesmo a comédia sabe o que é justo.
Eu falarei coisas terríveis, porém justas.] Aristófanes, Acarnenses, 497-500, fala de Diceópolis.

Philosophia

Sêneca sobre como com a filosofia é possível deixar as angústias da inépcia humana (humanae imbecilliatis angustias):


"disputare cum Socrate licet, dubitare cum Carneade, cum Epicuro quiescere, hominis naturam cum Stoicis vincere, cum Cynicis excedere." (De Breuitate Vitae, 14, 2.)

[É possível debater com Sócrates, duvidar com Carnéades, tranquilizar-se com Epicuro, vencer a natureza do homem com os estóicos, e ultrapassá-la com os cínicos.]

nehm´ den Koffer in die Hand und verlasse das Land

"Ich schiebe die Wolken zur Seite
und beginn meine eigene Reise
nehm´ den Koffer in die Hand
und verlasse das Land" - Lass los, Lea-Marie Becker

Beim Himmel, dieses Kind ist schön!

Mephistopheles
Du sollst das Muster aller Frauen
Nun bald leibhaftig vor dir sehn.

(...)

Faust
Beim Himmel, dieses Kind ist schön!
So etwas hab ich nie gesehn.
Sie ist so sitt – und tugendreich,
Und etwas schnippisch doch zugleich.
Der Lippe Rot, der Wange Licht,
Die Tage der Welt vergeß ich’s nicht!


[Mefistófeles:
Tu deverás ver o paradigma de todas as mulheres
Muito em breve em carne e osso diante de ti.

(...)

Fausto:
Pelos céus, como é Linda essa menina!
Tanto assim nunca tinha visto.
Ela é tão decente – e tão virtuosa,
E algo de atrevida também ao mesmo tempo.
O lábio vermelho, a luz da bochecha,
Não a esquecerei um dia sequer da minha vida.]

A democracia inexistente

"κύριος γρ ν δμος τς ψήφου, κύριος γίγνεται τς πολιτείας." - IX, 1, Pseudo-Aristóteles, Constituição dos Atenienses.

[Sendo o demos senhor da urna (lit. da pedrinha; do voto), torna-se senhor do Governo (politeia).] - Será mesmo?

Das freiwillige Leben in Eis und Hochgebirge

"Philosophie, wie ich sie bisher verstanden und gelebt habe, ist das freiwillige Leben in Eis und Hochgebirge." Ecce Homo - Nietzsche

[Filosofia, como eu a entendi e vivi até agora, é a vida voluntária no gelo e em montanhas altas.]

Hitler

"Aber alle Genialität der Aufmachung der Propaganda wird zu keinem Erfolg führen, wenn nicht ein fundamentaler Grundsatz immer gleich scharf berücksichtigt wird. Sie hat sich auf wenig zu beschränken und dieses ewig zu wiederholen. Die Beharrlichkeit ist hier wie bei so vielem auf der Welt die erste und wichtigste Voraussetzung zum Erfolg." Mein Kampf, Kap. 6 - Kriegspropaganda - Adolf Hitler

[Mas toda genialidade da apresentação da propaganda leva a nenhum sucesso, se um princípio fundamental não é sempre e agudamente considerado. Ela deve se limitar a poucas coisas e repetir estas eternamente. A tenacidade é aqui, como em tantas coisas no mundo, o primeiro e mais importante pressuposto para o sucesso.]

Dizem que desse trecho e, provavelmente, de outros desse mesmo capítulo do Mein Kampf, e, outrossim, de outras obras de propaganda nazista, nasceu o famoso ditado, errôneamente atribuído a Goebbels: "Uma mentira dita inúmeras vezes se torna verdade." É ainda mais surpreendente saber que Hitler foi alçado ao poder democraticamente, como líder do Partido Nacional-Socialista, mesmo depois de ter escrito o livro que escreveu.

Wednesday, 29 December 2010

Irrt der Mensch

"Es irrt der Mensch solang' er strebt." [Erra o homem enquanto ele empenha-se arduamente por algo/ aspira a algo tenazmente ( no inglês: strives)]

Goethe, Faust, Der Herr, Prolog im Himmel, 317.

desiderio urbis

"non dici potest quam flagrem desiderio urbis, quam vix harum rerum insulsitatem feram."

[Não se pode dizer com quão flagrante desejo pela cidade [lit. da urbe] ardo, quão mal suporto a insipidez dessas coisas.] Cícero, Epístolas Ad Atticum, V, 11.1.

Thursday, 16 December 2010

Nescioquomodo

"Nescioquomodo enim minus mortem timet qui minus deliciarum novit in uita." Vegetius, Epitoma rei militaris, 1.3.5

Wednesday, 8 December 2010

Sêneca

"Numquam credideris felicem quemquam ex felicitate suspensum. Fragilibus innititur qui aduenticio latus est; exibit gaudium quod intrauit. At illud ex se ortum fidele firmumque est et crescit et ad extremum usque prosequitur: cetera quorum admiratio est uulgo in diem bona sunt. 'Quid ergo? non usui ac uoluptati esse possunt?' Quis negat? sed ita si illa ex nobis pendent, non ex illis nos. Omnia quae fortuna intuetur ita fructifera ac iucunda fiunt si qui habet illa se quoque habet, nec in rerum suarum postestate est."

[Nunca creias feliz aquele que depende de felicidade. Em fragilidades se sustenta o que é feliz com um adventício; sairá a alegria que entrou. E aquela [alegria] que tenazmente é originada de si e é firme, tanto cresce como prossegue até ao fim: As outras coisas pelas quais o vulgo tem admiração são boas efemeramente (lit. no dia). 'E então? não podem ser de uso e comprazimento?" Pelo contrário (lit. Quem nega?). Mas, de modo que, se elas dependem de nós, não nós delas. Todas as coisas contempladas pelo acaso se tornam de tal modo frutíferas e satisfatórias se aquele que as tem, tem também a si mesmo, e não está tomado pelos seus próprios bens (lit. não está em poder das suas próprias coisas).] Epístola 98, 1.

Fernando Pessoa

Às vezes entre a tormenta, quando já umedeceu, raia uma nesga de céu, com que a alma se alimenta. Fernando Pessoa - Cancioneiro

Faz bem só pensar em ver
Seu corpo meio maduro.

Seus seios altos parecem
(Se ela estivesse deitada)
Dois montinhos que amanhecem
Sem ter que haver madrugada.

E a mão do seu braço branco
Assenta em palmo espalhado
Sobre a saliência do flanco
Do seu relevo tapado.

Apetece como um barco.
Tem qualquer coisa de gomo.
Meu Deus, quando é que eu embarco?
Ó fome, quando é que eu como?

Fernando Pessoa - Cancioneiro


Se fala na Ana não é porque saiba o que ela é,
Mas porque a ama, e amo-a por isso,
Porque quem ama nunca sabe o que ama
Nem sabe por que ama, nem o que é amar...

Amar é a eterna inocência,
E a única inocência não pensar...

Alberto Caeiro - (com a leve modificação de uma palavra)
 

Saturday, 4 December 2010

carpe noctem

"(...) das Leben ein Geschäft ist, das nicht die Kosten decken" Schopenhauer apud Nelson Hungria In: Comentários ao Código Penal. Vol. 5, 222p.

das nicht die Kosten decken

Carpe noctem, quam minimum credula postero

Friday, 3 December 2010

Um pedaço de sanduíche na cozinha - Pessimismo filosófico fenomenológico


Deixei um pedaço de sanduíche, quase todo comido, e, portanto, muito pequeno, numa parte da cozinha. Não tinha notado que o deixara lá. Dois dias depois, quando o notei, por acaso, ele está podre, completamente preto e com, pelo menos, 40 larvas. É absurdo quanto a vida é abjeta e obstinada. Duas perigosas características. Alçamos a vida a valor maior, a ápice de nobreza, quando, na verdade, ela não é assim, mas é tornada assim  por nós. Agarramo-nos a ela tenazmente, mesmo quando ela é completamente vil, podre, asquerosa, repulsiva.

David Benatar, me parece, escreve muito bem sobre como tendemos a dizer que, supostamente, nos recusaríamos a viver em determinada circunstância "x", pois alegadamente "x" tornaria a vida insustentável, porém, quando somos submetidos a "x", em regra, nos adaptamos.
Ser paraplégico é um exemplo de "x". Muitos dizem que se fossem obrigados a viver em uma cadeira de rodas a vida se tornaria completamente intolerável, porém, não é o que ocorre na prática. De fato, as pessoas se adequam aos males mais diversos que a vida impõe, por mais graves que eles sejam.
Nesse sentido, há inúmeros exemplos de "x", como, p.ex., aqueles milhares de homens e mulheres que vivem, literalmente, no lixo, como as larvas que eu mencionei, obtendo o sustento dos restos despejados em grandes lixões. O documentário Ilha das Flores, de Jorge Furtado, e o poema O Bicho, de Manuel Bandeira[1], não me deixam mentir.

Há que se mencionar, igualmente, aquela grande maioria que, durante a segunda guerra mundial, mesmo em campos de concentração, em condições ditas subumanas, não cometeu suicídio. Ou ainda, o 1.4 bilhão de pessoas que vivem abaixo da linha da pobreza, em situação de franca derrelição e miserabilidade, que, mesmo em um país rico, como os EUA, assomam, espantosamente, aproximadamente, 44 milhões e, na Índia, 410 milhões. É desnecessário dizer, por exemplo, que essas pessoas têm o mais precário, quase nulo, acesso à saúde, à educação, à alimentação, à habitação e que, estão expostos aos mais diversos tipos de violência e de vulnerabilidade.

Ainda assim, eles vivem e escolhem viver, irresignadamente, como se o mero ser, como se mero viver, tivesse valor intrínseco a ele, como a se a mera possibilidade, ainda que remota, de um dia a situação ficar um pouco menos pior fosse capaz de motivar a quantidade infindável e interminável de penúrias pelas quais essas pessoas passam.
O paradoxal de tudo isso é que nossas vidas, as vidas “medianas”, consideradas boas, não são nem de perto tão boas quanto assume a maioria das pessoas.
Tentamos, no fundo, precariamente, diminuir, atenuar os males da vida, evitar males graves e desnecessários, tomando precauções, inventando medicamentos mais eficientes, implementando medidas de higiene, etc. Ao mesmo tempo em que buscamos, de maneira supérflua, maximizar, tanto quanto possível, os prazeres. A mentalidade das pessoas é hedonista ao extremo e não se dão conta elas de quão residual é nossa condição. Nossas vidas, mesmo as menos piores, continuam sendo muito ruins e, ademais, a volubilidade da Fortuna, cruel como é, está sempre à espreita, pronta para demolir nossas frágeis conquistas. Em realidade, continuamos a viver num bueiro, num pedaço podre de carne (i.e. o planeta terra), sugando dele tudo o que pode oferecer, produzindo, literalmente, quilos de lixo por dia[2] e toneladas por ano, por pessoa, e, mesmo assim, teimamos em achar que está tudo perfeitamente bem apenas por tornarmos a latrina um pouco menos repugnante.
Comer, defecar, adoecer, passar horas realizando tarefas banais e idiotas, como andar de carro, em mero deslocamento, tomar banho, escovar os dentes, dormir horas e horas por dia inutilmente, são tarefas inteiramente sem serventia, imprestáveis, que não valem de nada. São ruins, desagradáveis, residuais (como bem as chamou Cabrera), porém, realizadas única e exclusivamente porque nos submetemos ao quão ruim a vida é. Passamos a maior parte de nossas vidas realizando ações desse tipo, sem qualquer valor para nós e continuamos defendendo, equivocadamente, que vale a pena viver. Essas ações, como também mostrou Benatar são, outrossim, negligenciadas, só porque são males que, ainda que graves, permeiam as vidas de todos nós, como se isso anulasse ou neutralizasse a gravidade dessas nefastas tarefas do nosso morrer cotidiano.



[1] O Bicho
Vi ontem um bicho
Na imundície do pátio
Catando comida entre os detritos.

Quando achava alguma coisa,
Não examinava nem cheirava:
Engolia com voracidade.

O bicho não era um cão,
Não era um gato,
Não era um rato.

O bicho, meu Deus, era um homem.

[2] Cada pessoa produz, em média, pelo menos 2 quilos de lixo por dia.

Cicero belissimus

"Cicero belissimus tibi salutem plurimam dicit." (Ad familiares, 17.4)

"deesse aliquid nobis uidebitur et semper uidebitur"

"Ante ad mortem quam ad uitam praeparandi sumus. satis instructa uita est, sed nos semper in instrumenta eius auidi sumus; deesse aliquid nobis uidetur et semper uidebitur: ut satis uixerimus, nec anni nec dies faciunt sed animus. uixi, Lucili carissime, quantum satis erat; mortem plenus expecto."

[Devemos estar preparados antes para a morte do que para a vida. A vida está suficientemente preparada, mas nós sempre estamos ávidos para suas utilidades. Algo sempre parece faltar para nós e sempre parecerá: nem anos, nem dias fazem com que tenhamos vivido suficientemente, mas personalidade/disposição (animus). Vivi, caríssimo Lucílio, o quanto era suficiente. Aguardo a morte completo.]

[Sócrates] questionava a todos os homens

Ti/ de\ ei) a)nhrw/ta i)di/ai kai\ koinh=i pa/ntaj a)nqrw/pouj, o(/ti ou)de/n ei)dei=en ou)/te di/kaion ou)/te kal/on

[E se, de fato, questionava, em particular e em público, a todos os homens, que nada sabiam, nem o justo, nem o belo.]

Epistulae Socraticorum 17.