Monday, 5 January 2015

Limite, de Mário Peixoto

O enredo aborda a história de três personagens, duas mulheres (Olga Breno e Taciana Reis) e um homem (Raul Schnoor) que relembram os acontecimentos que os levaram a um barco perdido na imensidão do mar: Taciana Reis abandona o casamento opressor, com um marido bêbado e pianista fracassado; Olga Breno escapa da prisão com ajuda do carcereiro, para se ver novamente enjaulada pelo trabalho monótono à máquina de costura; Raul Schnoor envolve-se com mulher casada e leprosa e, frente à possibilidade da castração, entra em desepero. Os planos de Limite, em geral longos, com enquadramentos precisos, reiteram as diversas prisões pelas quais os personagens atravessam, tudo emoldurado pela paisagem de Mangaratiba, onde se deram as filmagens. O homem torna-se responsável por suas próprias algemas, pois, a fim de suportar o fardo de que o mundo existe independentemente dele, cria o tempo, que se revela através das memórias dos personagens à deriva na imensidão tanto do mar quanto do horizonte.


Peixoto’s text does not tell a story, nor does it give insights into any kind of psychological state of mind among the three main characters. Rather, it “thinks” in pictures, movements and angles, trying to intertwine the diverse visual fields by using certain symbolic themes and variations. From the outset, the filmic style of Limite is part of the scenario and not a result of an interpretation or transformation of the textual outline by subsequent shooting. The metaphor of the “camera brain” – a frequent term used by many avant-garde filmmakers – is also present in Peixoto’s scenario, in which the use of intertitles is avoided, with one short exception, and reliance is placed overall on the camera and its movements.


imite must be seen as a film with a clear, elaborated and recognisable concept. This may explain Peixoto’s dislike of surrealistic movies, specifically those of Luis Buñuel, and the rejection of chance as an artistic principle, as found in Man Ray or Dada. Limite starts off with the image of a woman embraced by a man in handcuffs, a prototype image that goes on being modified throughout the film. The opening proto-image, from the photograph he saw in Paris in 1929, introduces the leitmotiv of imprisonment, of being trapped, and gives way to a long, almost hypnotic boat scene that is to transport us into the continuum of time, a rather fluid amorphous state in which the camera then moves into the past, tracing certain memory lines, episodes and associated details, objects, movements and images. These visual flashes of limitations are reflected in other images and thus escape from their fixed, limited and solid status, only to disappear or fade out without further explanation. The wrecking in the storm at the end then leads us back to the original proto-image, the initial theme, now extended and enriched by the visual and rhythmic variations that have been experienced. The scenario and film can therefore best be characterised as a visual cinematic poem that explores the medium for its poetic capacities, instead of using it for transporting non-visual conceptions and narratives. 

Passagem do tempo e condição humana
Em um pequeno barco à deriva, duas mulheres e um homem relembram seu passado recente. Uma das mulheres escapou da prisão; a outra estava desesperada; e o homem tinha perdido sua amante. Cansados, eles param de remar e se conformam com a morte, relembrando (através de flashbacks) as situações de seu passado. Eles não têm mais força ou desejo de viver e atingiram o limite de suas existências.

Em Limite, a câmera desenha movimentos transgressores, posta-se em ângulos inusitados, descobre formas e tons ocultos acima, abaixo, transversos à linha reta por onde toda e qualquer história se desenvolve. Ali, onde um qualquer fundo cênico e toda ação rege uma reação em resposta – e esta uma terceira, uma quarta, e outra, até que todas possam se encontrar ou anular –; ali, naquele lugar de sempre, naquele locus onde todas as narrativas se equivalem, a câmera descobre a geometria insuspeita dos telhados, e os bredos pelo caminho, e os sapos, e o vento, e o mar, o mar, o mar; descobre-os e assume-os como personagens, porquanto também a eles pertence a história daquela paisagem arruinada pela falência de um sistema econômico de que outrora fora a capital.

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