"Jesus morre, morre, e já vai deixando a vida, quando de súbito o céu por cima da sua cabeça se abre de par em par e Deus aparece, vestido como estivera na barca, e a sua voz ressoa por toda a terra, dizendo, tu és o meu filho muito amado, em ti pus toda a minha complacência.
Então Jesus compreendeu que viera trazido ao engano como se leva o cordeiro ao sacrifício, que a sua vida fora traçada para morrer assim desde o princípio dos princípios, e, subindo-lhe à lembrança o rio de sangue e sofrimento que do seu lado irá nascer e alagar toda a terra, clamou para o céu aberto onde Deus sorria, Homens perdoai-lhe, porque ele não sabe o que faz. Depois, foi morrendo no meio de um sonho, estava em nazaré e ouvia o pai dizer-lhe, encolhendo os ombros e sorrindo também, nem eu posso fazer-te todas as perguntas, nem tu podes-me dar todas as respostas. Ainda havia nele um resto de vida quando sentiu que uma esponja embebida em água e vinagre lhe roçava os lábios, e então, olhando para baixo, deu por um homem que se afastava com um balde e uma cana ao ombro. Já não chegou a ver, posta no chão, a tigela negra para onde o seu sangue gotejava." SARAMAGO, José. Evangelho segundo Jesus Cristo. São Paulo: Companhia das Letras, 1991. 444p.
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