Rui Barbosa, em sua "Oração aos moços", escreve: «Mais pode
que os seus azares a constância, a coragem e a virtude». Quando li este
período, surpreendi-me com o que supus ser um "cochilo" do autor, para
mim um dos maiores de nossa língua («Quandoque bonus dormitat Homerus»,
disse Horácio). Todavia, ao pesquisar em Napoleão Mendes de Almeida
("Dicionário de Questões Vernáculas", 4.ª ed., São Paulo, Ática, 1998,
p. 587), na entrada "verbo no singular antes de sujeito composto",
encontrei a explicação: «Se o sujeito composto vier depois do verbo,
poderá ficar no singular». Surgiu-me, daí, a dúvida: qual a origem desta
regra? O que a justifica?
Grato pela atenção e parabéns pelo trabalho que realizam.
Eduardo A. Paglione
Portugal
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Celso Cunha e Lindley Cintra, na sua Nova Gramática do Português Contemporâneo,
apresentam mais alguns casos em que uma forma verbal se apresenta no
singular quando pertence a uma oração com mais de um sujeito. Para além
da circunstância referida (o verbo antecede um sujeito composto),
apontam ainda as seguintes (os exemplos também são retirados da NGPC):
– Quando os sujeitos são sinónimos/sinônimos ou quase sinónimos/sinônimos («A conciliação, a harmonia entre uns e outros é possível», A. Abelaira);
– Quando há uma enumeração gradativa («O grotesco, o pobre, o sem forças era triturado agora na pressão dessa grande cidade», A. Bessa Luís);
– Quando os sujeitos são interpretados como se constituíssem em conjunto uma qualidade, uma atitude («A grandeza e a significação das coisas resulta do grau de transcendência que encerram», M. Torga).
A resposta às perguntas «Qual a origem destas regras? O que as justifica?» na verdade não pode ser dada com exactidão/exatidão. A concordância da forma verbal com apenas um dos sujeitos da frase quando esta contém vários sujeitos coordenados por meio de uma copulativa já se atesta nos autores latinos e, possivelmente, o Português continuou esta possibilidade.
No que toca à justificação da regra, podem-se considerar duas questões: porque é que os gramáticos normativos como Napoleão Mendes de Almeida consideram tais frases correctas/corretas?; porque é que o Português admite tal possibilidade independentemente de quaisquer juízos de valor sobre estas construções? Quanto à primeira, provavelmente o que se passa é que os puristas consideram esta possibilidade legítima porque ela se manifesta nos escritores da nossa língua (como se pode ver pelos exemplos acima expostos) e também porque já era usada pelos autores clássicos latinos (frequentemente a lógica é que se em latim está correcto/correto, em Português também estará). Quanto à segunda questão, deve, como é óbvio, haver uma justificação para a existência deste uso, pois, da pessoa mais culta à mais ignorante, ninguém fala de qualquer maneira, existem sempre regras por trás do que dizemos. A verdade é que, quanto a este caso assim como muitos outros, a resposta não é óbvia e ainda não se sabe a justificação.
– Quando os sujeitos são sinónimos/sinônimos ou quase sinónimos/sinônimos («A conciliação, a harmonia entre uns e outros é possível», A. Abelaira);
– Quando há uma enumeração gradativa («O grotesco, o pobre, o sem forças era triturado agora na pressão dessa grande cidade», A. Bessa Luís);
– Quando os sujeitos são interpretados como se constituíssem em conjunto uma qualidade, uma atitude («A grandeza e a significação das coisas resulta do grau de transcendência que encerram», M. Torga).
A resposta às perguntas «Qual a origem destas regras? O que as justifica?» na verdade não pode ser dada com exactidão/exatidão. A concordância da forma verbal com apenas um dos sujeitos da frase quando esta contém vários sujeitos coordenados por meio de uma copulativa já se atesta nos autores latinos e, possivelmente, o Português continuou esta possibilidade.
No que toca à justificação da regra, podem-se considerar duas questões: porque é que os gramáticos normativos como Napoleão Mendes de Almeida consideram tais frases correctas/corretas?; porque é que o Português admite tal possibilidade independentemente de quaisquer juízos de valor sobre estas construções? Quanto à primeira, provavelmente o que se passa é que os puristas consideram esta possibilidade legítima porque ela se manifesta nos escritores da nossa língua (como se pode ver pelos exemplos acima expostos) e também porque já era usada pelos autores clássicos latinos (frequentemente a lógica é que se em latim está correcto/correto, em Português também estará). Quanto à segunda questão, deve, como é óbvio, haver uma justificação para a existência deste uso, pois, da pessoa mais culta à mais ignorante, ninguém fala de qualquer maneira, existem sempre regras por trás do que dizemos. A verdade é que, quanto a este caso assim como muitos outros, a resposta não é óbvia e ainda não se sabe a justificação.
Francisco Costa
21 de abril de 2003
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